segunda-feira, 9 de junho de 2014

Setúbal


Quem me tirara os limos, tirara-me tudo. Porque eu sou da terra onde se vê até ao fundo do mar, onde as gaivotas voam em todas as janelas e se contam alforrecas das traineiras e navios. Inspiro esse perfume que vem de ti. E sei que entre mim e todas as pessoas partilha-se o mesmo saber: as histórias dos peixes, há quanto os puxaram à superfície, de onde os levaram. Sabemos onde ficam os bancos de areia na maré vaza, para onde nadam os cardumes: chicharro, besugo, salmonete e massacote, berbigão, conquilha, choco, linguado. Foram eles que nos trouxeram aqui, é por eles que existimos. Sabemos o cheiro das resinas quando ardentes ao sol, damos nomes à pedras. 
É todo e meu lar franco e singelo como uma sardinha e um pedaço de pão, um ramo de alfazema silvestre, um punhado de conchas na mão.
Eu sou da terra que vem do mar, do mar que veio para a terra. É quando te inspiro que chego a casa, minha dádiva.